terça-feira, 26 de agosto de 2014

A revolução

Parte da grande revolução que mudou os destinos da civilização ocidental no final do século XVIII, a

guerra da independência dos Estados Unidos (revolução americana) abriu uma nova era na história da

humanidade. E o país surgido desse movimento libertário tornou-se modelo e inspiração para as colônias

ibero-americanas em seu desejo de emancipação das potências colonizadoras.

Origens: Dá-se o nome de revolução americana à luta das colônias estabelecidas na América do Norte,

para se tornar independentes da Grã-Bretanha. Vitoriosas, as colônias passaram a constituir uma

república independente, estabelecida com base em princípios democráticos que, pela primeira vez,

ganhavam forma estatal.

Iniciada em 1607, a emigração inglesa para a América do Norte deu origem à formação de colônias, que

em 1732 já eram 13. Entre as causas que concorreram para a guerra de independência (de 1775 a 1781)

figura o abandono em que estas se encontravam. Os colonos tinham, por isso, que resolver sozinhos

seus problemas, o que lhes dava uma posição de autonomia em relação ao governo metropolitano. Além

disso, os ingleses não estavam bem a par das condições das colônias e, preocupados com os próprios

problemas, não lhes dedicavam muita atenção.

Entrementes, aumentava a importância econômica das colônias, sobretudo depois que a Grã-Bretanha,

vitoriosa na guerra contra a França, acrescentou às suas possessões americanas todo o Canadá e as

terras situadas entre os montes Apalaches e o rio Mississippi. Após o conflito, encontrando-se em difícil

situação econômico-financeira, a Grã-Bretanha decidiu exigir das colônias a observância da Lei de

Navegação (Navigation Act), que limitava grande parte do intercâmbio comercial destas exclusivamente à

metrópole. Reprimia-se também o contrabando. Além disso, a Lei do Açúcar (Sugar Act), de 1764, que

regulamentava o comércio do açúcar, aumentava o descontentamento dos colonos. E os que

especulavam com a terra foram atingidos em seus interesses pelo decreto que proibia a colonização de

áreas situadas além dos montes Apalaches.

Diante da necessidade de manter dez mil soldados ingleses para a defesa das colônias, o Parlamento

aprovou em 1765 a Lei do Selo (Stamp Act), que estabelecia várias taxas a serem pagas por documentos

legais e oficiais, através dos quais os colonos iriam cobrir as despesas de manutenção das tropas

britânicas. A reação foi tamanha que o Parlamento teve de tornar sem efeito o decreto no ano seguinte.

Mas aprovou, em seguida, o Declaratory Act, em que afirmava ter "pleno poder e autoridade" para legislar

sobre as colônias.

Massacre de Boston: Em 1767, um novo decreto, o Townshend Act, tornou ainda mais tensas as

relações entre a metrópole e as colônias. Esse decreto estabelecia impostos sobre o chá, o chumbo, o

papel e o vidro, importados pelas possessões americanas. O dinheiro assim obtido destinar-se-ia a pagar

os funcionários britânicos das colônias. Estes eram muito mal vistos, pela maneira como agiam:

apreendiam mercadorias de comerciantes honestos e, muitas vezes, praticavam contrabando. A reação

dos colonos recrudesceu. Os comerciantes negaram-se a importar mercadorias britânicas, e o líder

revolucionário Samuel Adams levantou a população de Massachusetts.

Em 5 de março de 1770 ocorreu o chamado massacre de Boston. Dois regimentos britânicos que tinham

sido enviados para conter os radicais daquela cidade entraram em choque com uma multidão, matando

várias pessoas. As notícias espalharam-se por todas as demais colônias, e novamente o Parlamento

britânico foi obrigado a recuar e anulou, meses mais tarde, o Townshend Act.

Crise do chá: Após três anos de relativa paz, em 1773 foi aprovada a Lei do Chá (Tea Act), com o

objetivo de ajudar a Companhia das Índias Orientais a vender seus excedentes de chá nas colônias. Além

do elevado preço do produto, os compradores ainda teriam de pagar impostos, e o lucro de sua

comercialização reverteria, em grande parte, em favor dos agentes da companhia. Em represália, os

navios que transportavam chá para as colônias deixaram de ser descarregados, e tiveram de regressar à

metrópole. Foi novamente em Boston que os acontecimentos assumiram caráter mais grave. No dia 16 de

dezembro de 1773, vários colonos disfarçados de índios atacaram três navios no porto e jogaram ao mar

toda sua carga de chá. Esse incidente, conhecido como Boston Tea Party, foi o estopim da revolução.

A Grã-Bretanha viu-se então diante de duas alternativas: ceder mais uma vez ou adotar severas medidas

de repressão. Decidindo por estas últimas, votou o que os colonos denominaram Leis Intoleráveis

(Intolerable Acts), a mais enérgica das quais determinava o fechamento do porto de Boston até que os

proprietários do chá fossem indenizados.

Os colonos uniram-se para enfrentar a metrópole e, em 1774, realizou-se em Filadélfia o I Congresso

Continental, com a presença de delegados de todas as colônias, à exceção da Geórgia. Foi aprovada,

então, a Declaração de Direitos e Agravos (Declaration of Rights and Grievances), que exigia a revogação

das Intolerable Acts. O congresso tentou entrar em acordo com o governo inglês, mas fracassou. Com o

assentimento do rei Jorge III, o governo decidiu reforçar as tropas britânicas nas colônias, a fim de

garantir o cumprimento das decisões parlamentares.

Luta armada: Em abril de 1775, o general Thomas Gage, comandante das tropas britânicas em Boston,

decidiu prender dois dos principais líderes americanos, Samuel Adams e John Hancock, e apoderar-se do

material bélico reunido pelos colonos em Concord. Em Lexington, as forças de Gage entraram em choque

com grupos armados e, depois de uma troca de tiros, os britânicos seguiram para Concord, onde

destruíram a munição ali existente. De volta a Boston, enfrentaram novamente os colonos e foram por

eles dispersados. Era o início da revolução americana.

O II Congresso Continental, reunido em Filadélfia, designou George Washington para comandar as forças

dos colonos. Ainda havia esperanças de que a coroa fizesse concessões para evitar a separação. Mas

por toda parte a autoridade real entrava em colapso: vários governadores refugiaram-se a bordo de

navios ingleses e voltaram para Londres; outros foram aprisionados. A situação tornava-se de fato

inconciliável: a saída era a submissão total ou a independência. A pregação libertadora encontrou um

vigoroso apóstolo em Thomas Paine, cujo panfleto Common Sense (1776; O bom senso) atacava o

princípio mesmo da monarquia hereditária, afirmando que um só homem honesto vale mais para a

sociedade "do que todos os bandidos coroados que já existiram".

Enquanto isso, a luta prosseguia. Ethan Allen, de Vermont, e Benedict Arnold, de Connecticut,

expulsaram os britânicos do forte Ticonderoga, às margens do lago Champlain, onde dois dias depois

Crown Point foi tomada. Essas vitórias deram aos colonos uma passagem de comunicação com o

Canadá.

Designado comandante das tropas britânicas, em substituição a Gage, o general William Howe decidiu

tomar os montes Bunker e Breed, próximos a Boston, para fortalecer sua posição. A batalha de Bunker

Hill (monte Bunker) foi travada em junho de 1775, e custou tantas perdas aos britânicos que os colonos,

embora derrotados, consideraram-na uma vitória.

George Washington assumiu o comando das tropas que cercavam Boston, e treinou-as com rigor durante

1775. Nesse mesmo ano, no Canadá, o general Richard Montgomery, comandando as tropas

americanas, ocupou Montreal e seguiu para Quebec. O ataque a esta última cidade fracassou, e

Montgomery foi morto. A retirada dos americanos foi desastrosa, e os britânicos passaram então à

ofensiva. No ano seguinte (1776), Washington cercou Dorchester Heights, acima de Boston, o que levou

o inimigo a abandonar a cidade sem luta, deixando armas e munições. As tropas desalojadas seguiram

para Halifax, e Washington concentrou suas forças em Nova York, à espera da ofensiva britânica.

Declaração de Independência: Depois de um ano de debates, em 4 de julho de 1776 o Congresso

aprovou finalmente a Declaração de Independência, redigida por Thomas Jefferson, John Adams e

Benjamin Franklin. Esse documento de importância histórica universal inspirou-se nas idéias avançadas

de pensadores franceses e ingleses. Diz a declaração em seu preâmbulo:

"Consideramos evidentes por si mesmas as seguintes verdades: todos os homens foram criados iguais e

dotados por seu criador de certos direitos inalienáveis, entre os quais a vida, a liberdade e a busca da

felicidade; para assegurar esses direitos, constituem-se entre os homens governos cujos poderes

decorrem do consentimento dos governados; sempre que uma forma de governo se torna destrutiva

desse fim, o povo tem o direito de aboli-la e de estabelecer um novo governo..."

Mais concretamente, a declaração estipulava o direito das colônias a se tornarem "estados livres e

independentes", desligados de qualquer compromisso de obediência à coroa da Grã-Bretanha, com a

qual ficava rompida toda união política.

Em agosto do mesmo ano, Howe atacou Nova York, onde se travaram violentas batalhas. As tropas de

Washington tiveram, no entanto, de bater em retirada, atravessando Nova Jersey, até Delaware. No ano

seguinte, os britânicos ameaçaram Filadélfia. Washington tentou defender a cidade mas foi batido, e

novamente derrotado em Germantown, Pensilvânia. Paralelamente, o general britânico John Burgoyne

invadiu as colônias do Canadá. Retomou Ticonderoga e Crown Point, mas perdeu a batalha de Saratoga.

Decisiva para os americanos, essa vitória ajudou Benjamin Franklin a conseguir o auxílio da França. Logo

depois, a Espanha entrou na guerra contra a Grã-Bretanha. Na guerra naval destacou-se John Paul

Jones. No comando do Bon Homme Richard, bateu-se contra o navio britânico Serapis, episódio que

constituiu a maior batalha naval da guerra.

Capitulação dos britânicos: Em 1778, a luta estendeu-se para o sul. Henry Clinton, o novo comandante

das tropas britânicas, tomou a Geórgia e dois anos depois apoderou-se de Charleston, Carolina do Sul,

aprisionando o exército de cinco mil homens do general Benjamin Lincoln. Os ingleses controlavam quase

todo o sul, mas tinham de enfrentar freqüentes ataques de guerrilheiros americanos. As forças da

metrópole tentaram uma ofensiva contra a Carolina do Norte, mas foram derrotadas em King's Mountain.

Daniel Morgan venceu tropas britânicas em Cowpens, (1781), mas o marquês de Cornwallis derrotou o

general Nathanael Greene, comandante das tropas americanas no sul, em Guilford Court House.

Cornwallis seguiu para a Virgínia em perseguição de uma tropa de colonos sob o comando do marquês

de Lafayette e tomou Yorktown, concentrando aí seus contingentes militares. George Washington, à

frente de um exército de 16 mil homens, atacou o inimigo por terra, enquanto o almirante francês François

de Grasse lhe dava cobertura naval. Ao final de várias semanas de lutas, Cornwallis rendeu-se com todos

os seus efetivos. A guerra estava praticamente terminada.

Em março de 1782, o chefe do governo inglês Lord North, renunciou. A paz de Versalhes foi ratificada

formalmente em 3 de setembro de 1783, com o reconhecimento da independência dos Estados Unidos da

América. Nesse mesmo ano, a Grã-Bretanha cedeu a península da Flórida à coroa espanhola, sem, no

entanto, delimitar as fronteiras, fato que motivaria intensas disputas territoriais no sul dos Estados Unidos

durante muitos anos.